A LEI DO ESTAGIÁRIO -- COMENTÁRIOS
"No dia 25 de setembro de 2008 foi promulgado a Lei nº 11.788, que revogou a Lei nº 6.494/1977, trazendo novos dispositivos sobre a relação trilateral que existe entre o estagiário, tomador de serviço e a instituição de ensino.
RELAÇÃO ENTRE ESTAGIÁRIO - INSTUIÇÃO DE ENSINO E TOMADOR
A Lei em apreço mantém algumas exigências trazidas pela Lei anterior, como, por exemplo, a obrigatoriedade do contato de estágio ser expresso e pactuado entre o tomador e o estagiário, mais necessariamente homologado pela instituição de ensino, bem como identidade nas funções exercidas pelo estagiário serem equivalente àquelas que são objeto do curso, fatos estes que se extraem da simples leituras dos incisos II e III do art. 3º da Lei, deixando claro a sua indispensável preocupação na não ocorrência de maquiagem de vínculo empregatício, o que infelizmente acontece na prática em grande número de estágios existentes.
CUIDADO!
Isso devido a carga tributária imposta na contratação de um empregado que em nosso país extrapola o limite do razoável, fazendo com que em muitas ocasiões empregadores contratem efetivos empregados, mas mascarem, disfarcem o vínculo de empregos denominando-os de autônomos, eventuais e até mesmo estagiários. Tanto é assim que o caput do art. 3º da Lei em apreço destaca a inexistência de vínculo empregatício, agora expressamente, desde que, é claro, preenchidos os requisitos necessários à configuração do lícito contrato de estágio, esclarecendo igualmente em seu 2º:
“O descumprimento de qualquer dos incisos deste artigo ou de qualquer obrigação contida no termo de compromisso caracteriza vínculo de emprego do educando com a parte concedente do estágio para todos os fins da legislação trabalhista e previdenciária.”
ACIDENTES NO ESTÁGIO
A atual Lei também mantém a necessidade do seguro contra acidentes pessoais a favor do estagiário, inovando somente no parágrafo único do art. 9º, quando alterna esta obrigatoriedade, antes exclusiva do tomador, com a instituição de ensino que poderá assumir o encargo, destacando a possibilidade do estagiário ingressar na previdência social como contribuinte facultativo.
No entanto, atual dispositivo legal também traz algumas inovações, umas de redação clara e inequívoca e outras, contudo, absolutamente confusas, como infelizmente tem se tornado hábito no Poder Legislativo em nosso País, como passamos a expor.
Nº DE ESTAGIÁRIO PARA CADA INSTITUIÇÃO
O art. 9º, III, da Lei nº 11.788/2008 destaca que cada profissional habilitado poderá ter sob sua coordenação e responsabilidade até dez estagiários, redação esta que, em princípio, se confunde com a do art. 17, que descreve:
Art. 17. O número máximo de estagiários em relação ao quadro de pessoal das entidades concedentes de estágio deverá atender às seguintes proporções:
I – de 1 (um) a 5 (cinco) empregados: 1 (um) estagiário;
II – de 6 (seis) a 10 (dez) empregados: até 2 (dois) estagiários;
III – de 11 (onze) a 25 (vinte e cinco) empregados: até 5 (cinco) estagiários;
IV – acima de 25 (vinte cinco) empregados: até 20%(vinte por cento) de estagiários.
Em um primeiro momento, a redação certamente nos parece confusa, pois, como o art. 9º destaca em seu inciso III a possibilidade de cada profissional habilitado ter até 10 estagiários se o número de estagiários dependerá do número de empregados constantes nos quadros da empresa tomadora de serviços?
Tal fato, todavia, se esclarece um pouco mais a frente, com a apreciação do § 4º do art. 17 da Lei que estabelece: “Não se aplica o disposto no caput deste artigos estágios de nível superior e de nível médio profissional”, o que denota que a imposição na contratação de estagiários dependente do número de empregados do tomador só se faz valer para os estágios de cursos especiais e não estes discriminados no texto legal exposto.
QUAL DEVE SER A JORNADA DE TRABALHO DO ESTAGIÁRIO?
Outra disposição que merece atenção e reflexão paira sobre o art. 10, que, a partir de então, impõe jornada de trabalho ao estagiário estabelecendo limites nos seguintes parâmetros:
I – 4(quatro) horas diárias e 20(vinte) horas semanais, no caso de estudantes de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos;
II – 6 (seis) horas diárias e 30 (trinta) horas semanais, no caso de estudantes de ensino superior, da educação profissional de nível médio e do ensino médio regular.
ESTAGIÁRIO EM DIAS DE PROVA
Ainda fixa em seu § 1º que, para os cursos que alternam teoria e prática, que é o caso, a guisa de ilustração dos estudantes de direito; a jornada, durante o período de férias, poderá ser prorrogada para quarenta horas semanais. Ressalva ainda fato de suma importância no § 2º quando estabelece que, em dias de provas, a carga horária imposta caíra, pelo menos, pela metade, ocasião em que os estudantes de cursos superiores somente poderão trabalhar três horas por dia.
O grande problema que paira sobre referido dispositivo legal é algo que, em muitos casos, maculam as leis brasileiras. Existe uma imposição, mas não há penalidade em caso de descumprimento, ou seja, o dispositivo de lei impõe uma obrigação, mas não criou sanção respectiva ao não cumprimento, o que certamente levará os especialistas a diversos posicionamentos.
A pergunta que não quer calar: se estagiário de nível superior trabalhar, por exemplo, oito horas por dia em qual penalidade o tomador de seus serviços incorreria?
Aplicar a ele as horas extras previstas no art. 59 da CLT, bem como o adicional de 50% estabelecido no § 1º do texto consolidado, parece temeroso, pois, se assim fosse, estaríamos impondo uma regra estabelecida exclusivamente para empregados a um tipo de trabalhador que sequer é regulado pelo Diploma Legal Consolidado.
Parece muito mais plausível, mas igualmente preocupante, o disposto no artigo art. 15, que estabelece:
Art. 15. A manutenção de estagiários em desconformidade com esta Lei caracteriza vínculo de emprego do educando com a parte concedente do estágio para todos os fins da legislação trabalhista e previdenciária.
§1º A instituição privada ou pública que reincidir na irregularidade de que trata este artigo ficará impedida de receber estagiários por 2 (dois) anos, contando da data da decisão definitiva do processo administrativo correspondente.
§2º A penalidade de que trata o §1º deste artigo limita-se à filial ou agência em que for cometida a irregularidade.
VÍNCULO DE EMPREGO?
Preocupante não pela gravidade da aplicação da pena ao impor vínculo de emprego, como também em não admitir naquele estabelecimento ou filial a contratação de estagiários por mais de dois anos, mas sim em razão de que não julgamos ser possível o reconhecimento o vínculo de emprego pelo descumprimento puro e simples, por exemplo, de extrapolação de jornada, mas sim pelo preenchimento dos requisitos exigidos pelo art. 3º da CLT, que são pessoalidade, habitualidade, subordinação, e onerosidade, este último, inclusive, que diferencia o estagiário do empregado, já que não há percebimento de salário, mas sim de bolsa auxílio, aliás, artigo cuja redação trazida pela Lei em tratamento é, por nova razão, confusa.
O art. 12 da Lei prevê:
BOLSA PARA O ESTAGIÁRIO?
Art. 12. O estagiário poderá receber bolsa ou outra forma de contra prestação que venha a ser acordada, sendo compulsória a sua concessão, bem como a do auxílio-transporte, na hipótese de estágio não obrigatório.
Ora, o artigo, em primeiro momento, destaca a palavra poderá, deixando claro a facultatividade do recolhimento da bolsa auxílio ou outro tipo de contraprestação, o que já ocorria na Lei anterior, para, em seguida, declarar que é compulsória a sua concessão? Prova eloqüente da confusa redação utilizada pelo legislador ordinário.
O que parece que devemos entender deste texto é que uma das duas hipóteses passaria a ser obrigatória.Assim, a partir de então, o estagiário passaria a recebe, obrigatoriamente, uma bolsa auxílio ou outra forma de contraprestação pelo serviço prestado, deixando claro a indispensabilidade e, agora, do percebimento também de vale-transporte.
Por isso entendemos que o Decreto nº 95.247/1987 passaria a ser aplicável também ao estagiário, até mesmo quando estabelece no art. 7º, § 3º, a incursão em falta grave quando declara fraudulentamente seu itinerário, para obtenção indevida de mais vales do que realmente precisaria, ou ainda o requerimento de vale-transporte quando o requerente se dirige de veículo próprio ao trabalho, ocasião em que incorre em ato de improbidade, previsto no art. 482, a, da CLT, ocasionando a demissão por justa causa do empregado.
Talvez o leitor julgue contraditória esta observação, pensando que não podemos aplicar as horas extras estabelecidas na CLT, mas podemos penalizar o estagiário com base em leis que dispõe sobre faltas graves exclusivas de empregado?
Não esse ponto. O que admitimos certamente é a demissão por justa causa, mas sim a possibilidade de se rescindir o contrato de estágio atos incorretos praticados pelo estagiário:
Art. 13. É assegurado ao estagiário, sempre que sempre que o estágio tenha duração igual ou superior a 1 (um) ano, período de recesso de 30 (trinta) dias, a ser gozado preferencialmente durante suas férias escolares.
§ 1º O recesso de que trata este artigo deverá ser remunerado quando o estagiário receber bolsa ou outra forma de contraprestação.
Ressalva a possibilidade de fracionamento de férias (art. 13, § 2º, da Lei nº 11.788/2008), no caso de estágio ter duração inferior a um ano, o que nos parece que o estagiário que fosse desligado do estágio no curso deste ano (que equivaleria ao período aquisitivo de férias de empregado), terá direito a férias proporcionais remuneradas, obviamente sem o terço constitucional, este devido somente aos empregados e que não seria aplicado ao estagiário simplesmente por falta de amparo legal.
CONTRATOS DE ESTAGIÁRIO
O que merece atenção aqui é se os contratos de estágio em vigor seriam vinculados, a partir da publicação da Lei, às exigências por ela trazidas ou se isso somente valeria pra os contratos pactuados a partir de sua promulgação.
Entendemos ser positiva a resposta para a aplicabilidade da Lei aos contratos em vigor praticamente em todos os seus artigos, pura e simplesmente em razão do princípio da aplicação da lei no espaço e no tempo.
Sérgio Pinto Martins destaca, em seu livro Direto Processual do Trabalho (27º Ed., p. 36), que:
“Assim, os atos processuais já praticados estão resguardados pelo direito adquirido e pelo ato jurídico perfeito, não se lhes aplicando a lei processual nova. Ao contrário, se a lei processual apanha situações que ainda estão em curso, porém não consumadas, sua aplicação é imediata a essas situações pendentes.”
De fato, é o que extrai do art. 1211 do CPC, bem como do art.912 da CLT, e isso, aplicável ao direito material, vincularia os contratos de estágio em vigor.
O mestre Arnaldo Sussekind in Instituições de Direito do Trabalho (19ª Ed., vol. 1) é claro e preciso quanto às normas de direito material:
“As leis de proteção ao trabalho são de aplicação imediata e atingem os contratos em curso. Por quê?Importa distinguir, aqui, o contrato do estatuto legal. Uma lei é relativa a um instituto jurídico quando visa a situações jurídicas que encontram sua base material nas pessoas ou coisas que nos cercam, criando, diretamente, sobre esta base, uma rede de poderes e de deveres suscetíveis de interessar a coletividade. Por exemplo, o casamento, a adoção, a propriedade, etc., constituem institutos jurídicos, ou seja estatutos legais.Ao contrário, uma lei é contratual quando visa a conjunto de direitos e obrigações entre as partes do contrato, que elas são livres, em princípio, de determinar por si mesmas, e que em muitos casos, somente a elas interessarão. (...)
Assim, quando a lei modifica os institutos jurídicos, quando estabelece um novo estatuto legal, os contratos que estavam apoiados sobre um estatuto diferente perdem sua base: terão, fatalmente, que serem modificados.Ora, as leis do trabalho dizem respeito a um estatuto legal, ao estatuto da profissão.”
Por este motivo, não temos com refutar ao nosso entender a aplicação da Lei nº 11.788/2008 aos contratos em vigor, salvo no que diz respeito ao art. 11, que destaca a possibilidade de se pactuar um contrato de estágio por prazo superior a dois anos, fato este que, inclusive, não consideramos justo, pois se ambas as partes entendem por bem em manter o vínculo de estágio por mais de dois anos, estão, a partir de agora, impossibilitadas de fazer valer suas vontades, o que gerará mais mão de obra ociosa e, em muitos casos, impossibilidade de efetivação do estagiário no quadro de empregados do tomador, após a conclusão do curso.
O que não entendemos como correto é que os contratos em vigor que já tenham duração de dois anos ou mais tenham que ser rescindidos, motivo pelo qual entendemos que referido espaço de tempo deverá ser contado a partir da eficácia da Lei." (Direito do Trabalho, 6ª edição, editora Rideel)
PARA AS PRÓXIMAS PUBLICAÇÕES VEREMOS:
Dicas para iniciar o estágio e permanecer nele;
Dicas para tirar proveito do estágio e realizar-se profissionalmente;
Dicas para falar bem e lidar com o público;
e mais....
Obs: as dicas que serão postadas são resultado de uma pesquisa que fiz com vários profissionais que são bem sucedidos na carreira profissional.